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Eu & a Autoridade Tributária

por Magda L Pais, em 28.04.15

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Nas últimas semanas e por causa de mais uma confusão na legislação portuguesa tenho ido várias vezes a uma repartição de finanças aqui de Lisboa. Hoje lá fui de novo, logo pela fresquinha, que é mais rápido.

E sai de lá com a certeza que a confusão não é só na legislação mas também nas mentes portuguesas.

Eu sei, todos sabemos, que estamos a sofrer, na pele, o aumento da carga fiscal, a diminuição dos rendimentos e o aumento do controlo fiscal. E também sei, todos sabemos, que a culpa é da Autoridade Tributária. Todos de acordo, certo? Então avancemos.

Meus caros, quem é, afinal, a Autoridade Tributária? Não sei se já pensaram no assunto mas eu já. E se não sei ao certo quem é a AT, há uma coisa que tenho a certeza – é que a AT, a responsável pelos maus momentos que passamos, não é o empregado que está sentado na repartição a atender os contribuintes. Esse empregado é tão contribuinte como nós e está sujeito aos mesmos cortes e aumentos que nós.

Gritar, ameaçar e barafustar com quem nos atende nas repartições da AT é o mesmo que gritar, ameaçar e barafustar com uma parede – ambos tem o mesmo poder de decisão, ou seja, nenhum! As leis, portarias, normas, etc., são elaboradas por quem tem poder para tal e quem o faz não está sentado à secretária a atender os lesados. Quem está na secretária a atender-nos é tao lesado quanto nós. Tem apenas o azar de estar do lado contrário e a dar a cara por uma entidade sem cara.

E também não vale a pena gritarem aos funcionários da AT que deviam contratar mais pessoas. Mais uma vez, quem vos está a atender não tem poder para decidir se devem, ou não, ser contratadas mais pessoas.

Pensem que, muitas vezes, os funcionários entendem os nossos problemas, querem ajudar-nos a resolvê-los mas estão impedidos porque não tem poder decisório.

Pensem nisto, na próxima vez que forem a uma repartição de finanças irritados com o sistema. Não descarreguem nos coitados que vos atendem, a culpa, garantidamente, não é deles.

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7 comentários

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Aerdna a 08.05.2015

A minha vida profissional foi a lidar com o atendimento ao público na área de gestão de reclamações. Dei durante muitos anos a cara por erros que me eram alheios, mas pagavam-me para isso. Pagavam mal. As pessoas merecem ser tratadas com respeito, isso não é discutível. Mas entendo as que se alteram. Se as pessoas não lutam com “as armas” que dispõem e entram no jogo do que “eu não posso fazer nada”, a coisa vai ficar por ali. Os verdadeiros responsáveis nunca vão dar a cara, e o funcionário provavelmente sobrecarregado vai deixar para o lado. Os funcionários que atendem ao público têm algumas obrigações que muitas vezes esquecem: são o elo de ligação entre o lesado e o poder de resolução e têm a obrigação de estar bem informado sobre a área que atendem (mas não se chatear a queimar pestana, dando más informações e passando a bola é muitas vezes mais fácil). As pessoas informadas sabem com alguma elegância, pedir para chamar os gerentes/responsáveis, ou o livro de reclamações. Direccionam um e-mail ou uma carta registada para as autoridades competentes. Quero dizer que não se alteram porque conhecem os seus direitos e sabem mover-se para os resolver. Mas a maioria da população, não conhece os mecanismos. Na escola que a maioria fez, a mim nunca me ensinaram o mínimo de cidadania. A única hipótese que estas pessoas têm de resolver as suas situações é aquele funcionário. E as pessoas não chegam aos berros aos balcões. Garanto-vos que quando chegam à situação do escândalo já desesperaram, já não sabem que mais fazer. Muitos dos que vemos a reclamar nos serviços públicos têm pouca escolaridade e foram ensinados a que se não pressionam, ninguém resolve. E até têm razão. Se essa é a forma de pressionar? Não. Mas quando se recebe a conta do IUC para pagar 3 vezes seguidas, e 3 vezes vamos às finanças, perguntamos se já está tudo bem, o funcionário diz-nos que sim, e voltamos a receber cartas, ficamos às aranhas e a imaginar que se não paramos esta bola, a casinha que demorou décadas a construir vai a leilão, porque eles não perdoam. Não é fácil! A culpa não é do funcionário que dá a cara, mas ele tem formação, e obrigação de aprender a não personalizar, e a orientar as situações para que não se repitam. É muito fácil e útil perpetuar erros, fazendo a bola da culpa andar de um lado para o outro. Atender ao público não é para todos, é preciso ter coragem e um feitio especial. É muito fácil, colocar a culpa no utente que se descontrolou. Mas tentem perceber o que o levou a essa situação e pensem se não vos apetecia fazer igual.
“Uma vez um cliente fez-me uma reclamação. Depois de analisar a situação, vi que tinha razão. Mas a regra número um: nunca se precipitar a dar razão. Cumpri o protocolo. Pedi licença, afastei-me e liguei ao meu superior, disse-lhe o que se passava e ele dá-me um rotundo Não. Dirige-me ao cliente e argumentei de forma a dizer que não iriamos satisfazer a sua pretensão. O senhor insistiu. Voltei a ligar. Resposta: Não. E andei neste joguinho. O cliente alterou-se. E começou a gritar. Volto a ligar. Resposta: Não. “Mas”, digo eu, “O cliente está profundamente irritado e já começou a berrar. Sabe que tem razão e não quer desistir.” Já aí vou, diz-me. Eu pensei que ele vinha dizer pessoalmente o que me repetia vezes sem conta ao telefone. Chegou com um sorriso de orelha a orelha a dizer ao cliente que ele tinha toda a razão. (Ele não queria era a escandaleira à frente dos outros clientes porque costuma ser de fácil contágio). A culpada: EU. O cliente convenceu-se que eu é que estava de má vontade. Lição aprendida: não voltar a tapar as costas ao chefe, sempre que a razão estiver do lado do cliente. Sempre que um cliente reclamava e eu achava que tinha razão, ligava a dizer que o cliente estava alterado. Os senhores levantavam logo o rabinho da cadeira almofadada e saiam do escritório com ar condicionado para resolver a situação. A minha prioridade resolver a situação. É muito fácil, aos responsáveis esconderem-se atrás dos que não têm culpa e perpetuar as situações.
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Magda L Pais a 08.05.2015

Acredita que te entendo. Eu atendo ao público há quase 25 anos e sei bem como é estar de ambos os lados. E sei bem que algumas das pessoas que trabalham nas finanças não sabem o que dizem (ainda hoje ouvi umas respostas bem idiotas uma jovem das finanças). Mas gritar e barafustar com eles não vai resultar. 
No dia em que escrevi este texto tinha estado nas finanças e uma senhora chegou ao pé da empregada que me estava  a atender e desatou ao berros com ela porque estava há mais de duas horas à espera de ser atendida e que deviam por mais pessoas a trabalhar.. Isto não faz qualquer sentido, não achas?
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Aerdna a 09.05.2015

Não faz sentido nenhum, acusar uma funcionária sobrecarregada, de não ter mais gente a trabalhar, quando ela reza por ajuda todos os minutos do dia. Isto para mim.
Mas para a minha avó (situação hipotética), que não lê nem escreve e tem o taxista à porta a cobrar, se calhar é o único recurso. Ela chega lá, nas suas vestes simples e pede para chamar o director. A funcionária vai declará-la logo como inepta, e já ninguém a vai ouvir mais. Ela sabe que aos berros, não resolve nada, e até que pode colocar-se em problemas com as autoridades, mas tem a esperança de somar o seu protesto ao de tantos outros e ajudar a fazer a diferença. “O silêncio sempre ajudou mais os carrascos que as vítimas”, diz o ditado. Não é bonito, é injusto para a funcionária, até porque a competência ou a falta dela, não está escrita na testa. Estas pessoas sem recursos que são chamadas a pagar como os outros e às vezes abusadas na sua ignorância não conhecem outro caminho. Cada caso é um caso. O ano passado, fui às Finanças (coisa que hoje em dia é raro, porque a net é fantástica, até para reclamar) e estava um senhor com o seu capacete no braço a reclamar aos berros. A minha primeira reacção "que falta de respeito com as pessoas". Depois ouvi o senhor dizer, que era de longe, que já tinha ido resolver o assunto várias vezes, e queria uma garantia de que desta vez ficava resolvido. Postura da senhora funcionária: risinho cínico (provavelmente por estar nervosa, mas é a pior opção nestes casos) e o" lamento mas, não posso fazer nada". Apesar de não ser aparentemente muito culto, o senhor fez a pergunta de um milhão "Se a senhora não pode fazer, diga-me quem pode?" E a incompetência da senhora falou mais alto: "Tem de ter paciência". A pior coisa que se diz a uma pessoa que está enervada é isso. Evidentemente, que ele já a tinha perdido há um bom bocado. Neste caso, devia ter trocado com outra colega, lançado um "vou ver o que consigo fazer por si". As pessoas não se alteram por prazer e sim por desespero, se mostramos que nos importamos acalmam-se logo. Mas a arrogância foi maior que a competência e acabou a inflamar os ânimos. Conto isto, para dizer, que se é verdade que muitas vezes as pessoas são só mal-educadas e ignorantes, outras chegam a estes sítios já com atitudes de ataque, por causa do arrogante "síndrome eu sou funcionário público "baixe a bolinha" se faz favor". Muitos funcionários adoptam esta atitude, para tapar a incompetência em lidar com o público. Nós que conhecemos os dois lados da barricada sabemos que é possível contornar as situações mais difíceis, mostrando vontade de ajudar, mesmo que na altura não nos ocorra como é que o vamos fazer. Simplesmente isto. Acalmar o interlocutor tem mais a ver com a postura do que conteúdo. Eu concordo com o post, o funcionário na maioria das vezes é só um peão. Mas estes peões fazem parte da máquina que é a AT. E num país onde ainda existe analfabetos, os funcionários são a sua única opção. Os funcionários competentes sofrem pela má imagem que os incompetentes semeiam, com posturas arrogantes. Para resolver o problema dos ânimos, eu acredito que se deve trabalhar os funcionários e não os utentes. São opiniões! Bom fim-de-semana!
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Magda L Pais a 09.05.2015

Ambos. é preciso e urgente educar ambos. Porque o utente é uma vitima, é verdade, mas os funcionários que atendem ao público também. O ano passado saiu uma lei que permitia que fosse feito um perdão fiscal em determinadas circunstâncias, devendo ser tratado nas repartições. Só que, quem fez a lei, esqueceu-se que os funcionários não teriam acesso, nas repartições, a aplicar esse perdão, que teria de ser feito nos serviços centrais. Calculas a quantidade de gente que acusou os funcionários de não querem aplicar a lei quando o problema era que não o conseguiam fazer? é verdade que há quem não saiba atender ao público e diga baboseiras. Mas também é verdade que, ás vezes, não conseguem fazer nada porque as coisas estão tortas de nascença 
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Aerdna a 09.05.2015

E como se actua nesses casos?
Quem tem as mesmas obrigações fiscais que todos os outros, mas não tem recursos?
Como é que faz para defender os seus direitos?
Aceita que a máquina AT não funciona paga e não fala?

Esse é o problema na cultura portuguesa, aceitar e não opinar.
Se é verdade que existem maneiras bem mais civilizadas de reclamar, muitas vezes não estão ao alcance de todos.
Temos uma população cada vez mais envelhecida e sozinha. Os funcionários públicos ainda são da velha guarda, e não têm formação e demasiada arrogância.
Os factos da vida real são melhor que a teoria: uma vez eu com 46 kg para os meus 1.77m de altura, em jejum, andava perdida nos HUC, em Coimbra, à procura de um serviço. Vi uma senhora, sentada a uma secretária, com uma lista, um telefone e um cartão de funcionária ao peito. Dirigi-me a ela "desculpe, precisava..." nem me deixou acabar "ainda não estou ao serviço, só daqui a 10m". As lágrimas caíram-me pela cara abaixo, porque estava fraca, mas se eu estivesse melhor não ia ser nada simpática, garanto.
É assim que as pessoas estão habituadas a ser tratadas na maioria das vezes, por isso, muitas vezes já chegam a atacar. Os maus modos de uns contaminam o trabalho de todos. Vai ser muito difícil corrigir sem não existir investimento na formação dos funcionários. Eles depois acabam por reeducar os utentes.
Não acha?
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Magda L Pais a 09.05.2015

e achas que generalizar os maus casos vai fazer com que o sistema melhore? ou será melhor pensar que há bons e maus funcionários como há bons e maus utentes? eu atendo ao publico num banco. Há colegas meus com os quais eu discuto pela forma errada com que eles atendem os clientes. Não posso aceitar que me digam que são todos iguais a esses que atendem mal. Há quem faça apenas o seu trabalho (e mal) como há quem exceda as suas competências tentando ajudar o cliente. Não só nos bancos como em todos os locais onde atendem ao público
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Aerdna a 09.05.2015

O problema é que os maus funcionários contagiam o sistema. Deixando pouco espaço de manobra a quem faz e quer fazer bem o seu trabalho.

No estado actual do país, poucos funcionários estão para se chatear porque o que ganham com isso é pouco ou nada. E quanto mais se acomodam calados, pior vão ficar. Os contractos “horários zero” são uma realidade aqui ao lado em Inglaterra. Com certeza os empresários portugueses já lhe colocaram o olho.

O que tento defender, é a formação das pessoas, é o inconformismo perante com que não está correcto. É as pessoas olharem para as situações no seu todo, e não apenas a superfície.
As pessoas sem ou com pouca escolaridade, já têm uma luta desleal na vida actual, por isso compreendo quando usam as armas que têm ao dispor, entendo quando já chegam a “atacar”. Deixar claro que uma coisa é uma cara feia e um tom de voz fora do normal, outra completamente diferente é o recurso a violência. Aí, passaram a linha. Mas elas sabem disso. As que lutam pelos seus direitos, sabem o limite. Os que passam a linha são criminosos. Ponto.

O país, não entrou em crise com este governo. Todos sabemos disso. O que é que fazemos? Coitadinhos, não têm culpa do ponto a que isto chegou, deixemo-los em paz. Ou por outro lado, somos todos grandes e responsáveis e eles sabem perfeitamente onde estão, e queremos que nos respondam com medidas que resolvam a situação, para isso como contribuinte pago os meus impostos?

Um mundo, melhor implica educar melhor as gerações actuais, para que não tenham de chegar a “humilhar-se” numa repartição de finanças, alterando o tom à voz, para que não continuem a ver os seus direitos desrespeitados.


A má educação não deve ter de acontecer. Nunca. Mas se as circunstâncias, não te permitem outra coisa, o que fazemos? Continuamos calados e a ver que nos desrespeitam de forma muitas vezes descarada? Não colocamos nenhum travão aos abusos de poderzinho?

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