Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]


Homicídio afectivo

por Magda L Pais, em 22.02.16

Não como mãe mas como ser humano, um dos crimes que mais me choca e que me deixa sem saber o que pensar, é quando os pais matam os filhos. Sim, quando é o inverso também me choca mas não tanto. Crucifiquem-me se quiserem mas é a minha maneira de pensar. Pais que maltratam (seja da forma que for) os filhos é um crime hediondo mas quando os matam, ultrapassa, em muito, o hediondo.

Precisamente por isso, e também porque gosto de perceber o mundo que me rodeia, aqui há uns anos assisti a um programa de televisão onde o tema central era precisamente as mães que matavam os seus filhos – na maior parte dos casos quando ainda eram de tenra idade – ou que se suicidavam levando os filhos por arrasto.

Foi a primeira vez que ouvi falar deste conceito retorcido do homicídio afectivo.

(confesso que desconheço se este termo existe, se é reconhecido na psicologia/psiquiatria ou mesmo juridicamente, mas, desconhecendo outro, creio que será o termo que talvez se adeque mais)

E o que é este conceito? Pois bem, grosso modo a mãe (ou o pai) mata o filho porque o ama e não o quer ver a sofrer. E dizem-me vocês, quem ama não mata. O que é totalmente verdade. Mas temos de perceber que as pessoas que cometem este tipo de crime não são pessoas saudáveis. São pessoas mentalmente doentes, em muitos casos com depressões profundas e que não conseguem ter um raciocínio normal.

Para elas, as crianças estão em sofrimento e só a morte as pode salvar. Para elas, que se vão suicidar, ao matar os filhos estão a poupar-lhes o sofrimento pela morte da mãe ou do pai.

Estas mães e estes pais não precisam que a sociedade os condene, a doença já o fez. O que precisam é de ajuda, de tratamento psiquiátrico. E, acreditem, quando estiverem bem, quando perceberem o mal que fizeram… serão elas próprias a condenar-se pelo que fizeram.

Naturalmente não defendo que escapem impunes ao que fizeram. Mas também não defendo julgamentos em praça pública ou que sejam ditas frases como “eu dava-lhe a depressão dava” a propósito da mãe que matou as filhas em Caxias (e outros casos que tais).

Porque, meus caros, a depressão não é coisa de meninos. E uma pessoa deprimida não consegue, por mais que tente, raciocinar como uma pessoa que não sofre da mesma doença. Não quer dizer que toda a gente deprimida se vá matar ou que vá matar os filhos. Mas pode acontecer.

Antes de começarmos a criticar e julgar temos de perceber o que realmente se passou. Em todos os casos!

Autoria e outros dados (tags, etc)


24 comentários

Imagem de perfil

José da Xã a 22.02.2016

agda,


também já escrevi sobre isso. Mas não cheguei tão longe.
Creio todavia que a sociedade em que vivemos, tão célere a criar heróis para logo a seguir os destruir da mesma forma, é de alguma forma inconcientemente culpada destas situações.
Eu sei o que é viver com alguém com depressão... Não fui eu (como costumo dizer em tom de brincadeira não tenho tempo para essas doenças!!!!) mas a minha mulher sofreu uma há alguns anos e de vez em quando quase que se afunda.
Vale-lhe a família... coisas que muita desta gente não tem.
Belo texto!
Imagem de perfil

Magda L Pais a 22.02.2016

Eu também sei o que é viver com uma depressão. E acredita, o que tem valido à pessoa em causa, é a família. Os pais, os tios, os irmãos, os avós. Porque é uma adolescente (e precisamente por causa dessa pessoa sou muito mais sensível a esta temática). Não tenho dúvidas que falta, à sociedade, perceber esta doença. Porque não são frescuras, é mesmo uma doença. E das complicadas. 
Obrigado e um beijo
Sem imagem de perfil

Olívia a 22.02.2016

Confesso que não tenho acompanhado o caso, não sei em que ponto vai... mas será que há assim tanta gente que se acha no direito de julgar? 
Tenho muita pena que se chegue ao ponto onde não há volta a dar, é sempre assim... antes ninguém viu? Ninguém percebeu? Ninguém ajudou? 
Image
Imagem de perfil

Magda L Pais a 22.02.2016

Ninguem viu, ninguem ajudou e todos (ou quase) estão prontos para atirar as farpas. Não a desculpo (à mãe) por ter matado os filhos. É um acto hediondo e sem desculpa possível. Mas é preciso também trata-la como pessoa doente e com certeza que não ficou doente naquele momento,... se estivessem atentos se calhar teriam percebido antes e tinham salvo as duas crianças
Imagem de perfil

Chic'Ana a 22.02.2016

Adorei o teu texto! Realmente a depressão é algo muito grave e muito sério, que deve ser acompanhado ao pormenor...
Beijinhos
Imagem de perfil

Magda L Pais a 22.02.2016

a depressão ainda é considerada, por muita gente, como uma mania, como uma desculpa. E devia ser considerada como doença grave e incapacitante...
Imagem de perfil

JP a 22.02.2016

Infelizmente a falta de aposta na saúde mental tem consequências mais graves do que se possa imaginar... depois o resultado muitas vezes é pautado de tragédias!
Imagem de perfil

Magda L Pais a 22.02.2016

tragédias essas que se podiam evitar. Bastava uma atenção mais cuidada à saúde mental das pessoas envolvidas
Imagem de perfil

JP a 22.02.2016

Mesmo... mas a saude mental continua com um grande estigma, inclusive entre os profissionais de saude. é algo transversal desde a própria concepção até à morte, incluindo na infancia com os momentos de vinculação com a mãe... mas infelizmente ainda não há uma grande aposta!
Imagem de perfil

Magda L Pais a 24.02.2016

o que é uma pena, na verdade. A saúde mental afecta muito mais do que se pode pensar à primeira vista
Imagem de perfil

Just_Smile a 22.02.2016

Tenho um caso próximo, uma professora da universidade, que se suicidou após ter sido mãe pela segunda vez. Uma das pessoas mais alegres que conheci, mais 'vingativas' também em que seleccionava alunos... No entanto, quando se soube da sua morte chocou-me imenso e nada mais se consegue encontrar para explicação que uma depressão pós-parto que nunca ninguém viu... Foi sozinha, mas partiu. 
Acredito que a depressão leve a estes extremos, matar os filhos por amor, mas sabes? Também tenho uma teoria, neste caso mediático que se fala das duas uma, ou a mãe foi realmente homicida ou teve muito azar. Por uma simples razão, se seria para se suicidar acredito que uma verdadeira mãe teria entrado na água e os instintos de sobrevivência terem desaparecido (como acontece em tantos casos), mesmo com a depressão, ou teve muito azar e sobreviveu...
No fundo, a depressão poderá ser uma resposta para o acontecimento, mas cada caso é um caso e este cheira-me a esturro e não me parece preto no branco...
Imagem de perfil

Magda L Pais a 22.02.2016

não sei os contornos todos do caso mas, por aquilo que percebi, pai e mãe queixaram-se do outro em ocasiões diferentes. O pai por achar que a mãe não estava em condições de tratar das filhas e a mãe por achar que o pai abusava sexualmente das filhas. Ao que parece, e no seguimento da queixa da mãe, foram feitas pericias ás crianças que não foram conclusivas. Entretanto os casos andaram cruzados dum lado e do outro e ninguém fez mais nada. Será que, se tivessem avaliado psicologicamente a mãe não teriam percebido isto antes?
A mãe pode ter-se arrependido mal entrou na água mas isso pode ter sido demasiado tarde para as crianças. Este caso tem demasiados "pode ter sido" mas o que não se pode, digo eu, é julgar sem se saber exactamente o que se passou
Imagem de perfil

Just_Smile a 22.02.2016

Não sei, é como dizes, há tanta coisa estranha neste caso em específico...
Mas sim, deveria ter-se em conta uma avaliação psicológica e mesmo aquando a queixa do pai...
Imagem de perfil

Magda L Pais a 22.02.2016

falhou essa parte, a da avaliação psicológica. E isso poderia ter salvo vidas
Imagem de perfil

Just_Smile a 22.02.2016

O problema é que o tipico governo e funcionamento de portugal é que é melhor chorar 'sobre o leite derramado' do que prevenir de que ferva...
Imagem de perfil

Magda L Pais a 24.02.2016

a prevenção tem custos financeiros elevados e por isso evita-se. Acaba por se pagar em vidas...
Imagem de perfil

Just_Smile a 24.02.2016

É menos uma a quem têm de pagar indemnizações, subsidios e afins...
Sem imagem de perfil

Magui Ferreira a 23.02.2016

Tão bom este texto, Magda, tão lúcido, tão imparcial, tão verdadeiro. 
Imagem de perfil

BataeBatom a 05.03.2016

Bem dito. Em qualquer situação,é errado julgar sem conhecer as pessoas e as suas verdadeiras intenções. Isto também se aplica aos jovens (aparentemente) delinquentes, agressivos, socialmente deslocados... Sabemos o que já viram/sofreram em casa para se terem tornado assim?
Imagem de perfil

Magda L Pais a 07.03.2016

e, ao que parece, é este o caso. O rapaz não seria "flor que se cheirasse" mas não se sabe o que se terá passado em casa para que ele fosse assim (e, ainda assim, nada justifica este crime)

Comentar post



Mais sobre mim

foto do autor








Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.