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Velhice

por Magda L Pais, em 23.12.14

Idosos-Abandonados.jpg

Quando comecei este blog, em 2008, era minha intenção partilhar textos meus, mas também textos de outros, de autores mais ou menos conhecidos mas que me dissessem alguma coisa.

É o caso do texto da Maria sobre o Sozinho em Casa. Este texto não nos fala dos filhos. Mas dos pais. Dos avós. Aqueles que são ignorados constantemente por quem eles cuidaram toda a vida.

Não se passa isto lá em casa. Enquanto foram vivos, demos, aos meus avós, tudo o que eles mereciam. Quando o meu avô esteve às portas da morte no hospital, fomos todos para a porta da enfermaria, à espera de vez para entrar. E quando ele regressou a casa, todos os dias um de nós ia lá. A minha avó esteve num lar mas todos os dias nos revessávamos nas visitas. Isto quando não íamos todos ao mesmo tempo. Quando chegava o Natal e o Ano Novo, íamos busca-la para estar connosco a quadra completa – apesar do lar ser a 10 minutos de carro do sitio onde estávamos.

Já não estão entre nós. Nem os meus avós nem os pais do meu tio. De todos temos saudades, com todos passávamos esta época do ano, todas as épocas de todos os anos, e de todos tratamos e acompanhamos até que nos deixaram.

Infelizmente não é isso que se passa em muitos lados. Muitos velhotes estão sozinhos. Não só no Natal mas todo o ano. 365 dias de tristezas, de solidão, de não terem com quem falar. Cuidaram dos filhos, dos sobrinhos e agora, que precisam que tomem conta deles, desapareceram todos.

Quase todos os dias convivo esta realidade. Quase todos os dias tenho pessoas – porque são pessoas, seres humanos – que telefonam para o meu trabalho só porque precisam de conversar. Fingem ter assuntos a tratar para ouvirem outra voz que não a delas. Que nos pedem ajuda, sem pedir, para saberem que estão vivos.

Alguns nem as consultas médicas conseguem marcar e recorrem a nós para o fazer. Para outros, os mais próximos, somos o contacto de emergência a quem o hospital liga quando são internados. Somos quem perde um dia de férias para os levar ao hospital numa urgência. Somos quem se preocupa se têm comido como deve ser, se tomaram os medicamentos. Porque a família, essa, nunca aparece.

Ou talvez apareça um dia. Sim, um dia aparecem. Quando já não forem precisos, para saber se há bens ou dinheiro a herdar. Ai lembram-se que tiveram um pai, um avô, um tio. Que morreu sozinho, sem ninguém com quem conversar. Se deixou bens, era uma excelente pessoa. Se não, raio do velho que nunca foi útil.

A esses, a esses que tratam assim os velhotes que cuidaram deles, só lhes desejo que um dia não se arrependam.

(Não sejam timidos, leiam o texto da Maria no link acima. Vale mesmo a pena)

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13 comentários

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Sofia Margarida a 23.12.2014

Esta realidade doí-me muito! Nem consigo comentar, faltam-me as palavras :(


Felizmente, os que tiveram a sorte de gerar a nossa família têm sempre quem cuide deles :D
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Magda L Pais a 23.12.2014

daqui a pouco, por volta das 18h, vou-me despedir dum dos velhotes que me inspirou a escrever este post e que vai ficar sozinho até segunda feira. Tem 97 anos e a familia dele somos nós, os que trabalhamos no prédio onde é porteiro. Tem sobrinhos mas a última vez que falou com eles foi à 10 anos... 
sim, há velhotes que tem a sorte de terem uma familia como a minha e como a tua. Mas não devia ser por sorte. Devia ser o normal e não a excepção 
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Sofia Margarida a 23.12.2014

Image opá, dá vontade de chegar e dizer, venha comigo passar a consoada... Bolas vida injusta! Esta sociedade que acolhe de forma tão desumana certas pessoas :'( 



Sim tens toda a razão, não devia sequer ser sorte... 
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Maria das Palavras a 23.12.2014

Não nos esqueçamos que um dia (se tudo correr bem) também seremos velhos. E talvez tenhamos a sorte ou o azar (consoante a pessoa) de nos darem o mesmo tratamento que nós aplicámos...
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Magda L Pais a 23.12.2014

semear para depois colher 
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Life Inc a 23.12.2014

Já ontem comentei o post da Maria. Gostei tanto. E também gostei de te ler. Um dia ainda hei-de escrever sobre este tema mas para já limito-me a comentar porque decerto haverá quem me lê da família e não vá achar piada ao conteúdo. Tive a sorte de conhecer as minhas duas avós, uma faleceu por esta altura faz 4 anos. Era a velhinha mais querida, sempre preocupada com todos mas sem chatear ninguém. Lá tinha os achaques dela - e eram muitos - mas raramente se queixava. Não julgava ninguém, desde que estivéssemos bem por ela tudo bem também. Ia lá bastantes vezes visitá-la, mas certamente não tantas como merecia. Quando era pequenina foi com ela que fiquei, bem como os meus primos. Foram tempos felizes e ainda me lembro dela a correr atrás de nós com a colher de pau e nós debaixo da mesa... Chegou a altura dela e foi, serena e em paz. A minha outra avó é o oposto. Acha sempre que temos de andar ao mando dela, sempre a visitar, nunca está satisfeita com nada e diz mesmo que a única felicidade dela foi na infância. É ótimo as filhas e netos ouvirem isto. Acha sempre que nunca fazemos o suficiente e realmente para mim é mesmo uma sacríficio às vezes ir visitá-la e ela mora do outro lado da rua. Mas para bem da minha sanidade mental não consigo lá ir mais que uma vez por semana... é triste mas é a verdade. Não lhe falta nada, a minha tia mora com ela, tem o amor dos netos, vive confortavelmente e tem tudo o que possa desejar. Mas é uma pessoa amarga e de difícil trato. Que não dá valor ao amor todo que tem à sua volta.
Desculpa o testamento :)

xoxo
cindy
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Magda L Pais a 23.12.2014

percebo bem essa história da tua avó resmungona. Já apanhei velhotes assim aqui no trabalho, que se queixam de tudo e de nada (e alguns, poucos infelizmente, de barriga cheia como se costuma dizer). A minha avó também era um bocadinho assim. Havia dias que era impossível de aturar e com a idade foi piorando bastante. Chegou ao ponto de fazer chantagem - no dia em que a minha mãe foi operada à coluna ligou-me a chorar que tinha deixado cair o jarro de água na cozinha e que precisava que a minha mãe lá fosse... lá me zanguei com ela. Dois dias depois já não era nada com ela.
Não acho que a tua avó esteja abandonada. Pronto, vocês acabam por estar com ela. talvez não tanto como vocês próprios gostariam mas estão o que é possível. E ainda há a tua tia - corajosa - que vive com ela. E isso ajuda imenso
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Cris a 23.12.2014

As histórias que há para contar sobre este assunto... Algumas pessoas esquecem-se que vão chegar a velhos.
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Magda L Pais a 25.12.2014

é exactamente esse o problema. Muitos esquecem-se que vão lá chegar tambem
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aprincesadacasa a 24.12.2014

Sinto-me triste e desiludida com essa realidade. Mas, todos nós lá chegaremos, e tal como diz o ditado "não faças aos outros o que não queres que te façam a ti"! Aproveito para te desejar um feliz Natal! 
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Magda L Pais a 25.12.2014

eu acho que alguns se esquecem desse ditado..

Feliz Natal também para ti
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M* a 24.12.2014

infelizmente, é uma realidade com tantas histórias tristes para contar. a minha mãe chegou a trabalhar num lar de idosos e é tão, mas tão chocante a maneira como muitos velhotes são tratados... 
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Magda L Pais a 25.12.2014


Acredito. Quem trabalha ou trabalhou num lar deve assistir a cenas que enfim

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